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Retrospectiva 2016
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Morte de Fidel Castro coloca Cuba diante de novos desafios e transformações

Especialista lembra trajetória do líder cubano e ressalta que abertura do regime já ocorria

News|Eugenio Goussinsky, do R7


Fidel Castro tomou o poder em 1959 e comandou Cuba por anos
Fidel Castro tomou o poder em 1959 e comandou Cuba por anos

A cada dia, as manhãs vêm e vão por trás das colinas de Havana. A revolução por lá é diária, no ritmo do sol, da lua e da maresia, que para uns sempre perfumou e para outros varreu sonhos. Nessa dança permanente entre luz e sombra, Fidel Alejandro Castro Ruz se incluiu certa vez, em 1959, tornando-se o sol de sua própria revolução. E no seu ritmo ele se pôs, aos 90 anos, após comandar o país sob regime ditatorial por mais de 40. Como se tudo, ao contrário do que parecia, tivesse ocorrido em apenas um dia.

Com seu afastamento do poder em 2006, transferindo a presidência de Cuba para o seu irmão Raúl Castro, o legado que o líder deixou já estava passando por transformações. Raúl implantou novas políticas, ampliando o trabalho privado, os incentivos às indústrias e o comércio de carros, entre outros, já percebendo o entardecer do regime que precisaria acordar a cada dia com outra roupagem, inclusive na manhã seguinte à despedida de Fidel.

O doutor em governança internacional, Gerson Damiani, do Instituto de Relações Internacionais da Universidade de São Paulo, é um dos que consideram que a revolução de Fidel, principalmente desde o desmantelamento da União Soviética e da queda do Muro de Berlim, em 1990, já estava sendo formada por várias revoluções diárias. E que os desafios para trazer o pleno desenvolvimento para o país continuam.

— Não foi do dia para noite, Fidel morreu mas as modificações já vêm ocorrendo desde 1990-1991, no momento em que o maior apoiador (União Soviética) deixou de existir, os laços que Cuba foi buscando também se encontraram nesse aspecto diante de um mundo multipolar. Obviamente o seu complicador numero um, os Estados Unidos, foi alguém que levou mais tempo para se aproximar, mas se aproximando também.

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Opositores vislumbram mudanças em Cuba após morte de Fidel Castro

Sem salsa e bebidas, turistas vivem realidade "alternativa" em Havana após morte de Fidel

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Filho de fazendeiro bem-sucedido, Fidel experimentou as diferenças sociais em casa, já que era fruto da relação do pai com uma empregada da fazenda, que acabou se casando com o patrão. Esse conflito pode tê-lo mobilizado desde cedo, fazendo ele, depois de cursar Direito, se embrenhar naquilo que considerava seu ideal de justiça. Mas, ao passar o poder para o irmão, Damiani acredita que Fidel já vislumbrava algumas mudanças no regime, mesmo que não revelasse.

— Não acredito que o que acontecia estava ocorrendo contra a vontade dele, o que existe em Cuba é um grupo de pessoas que são fieis a Fidel Castro. A gestão da política e da economia cubanas não estava ocorrendo em contraposição ao que Fidel vislumbrava, era uma abertura paulatina e isso deverá continuar a acontecer.

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Os ideais de Fidel, para o bem ou para o mal, se mostraram concretos na primeira tentativa de golpe, em 1953, quando ele acabou preso na Ilha de Pinos. Anistiado dois anos depois, foi morar no México de onde concebeu a revolução, após organizar guerrilha em Sierra Maestra e, tempos depois, entrar triunfalmente na capital cubana, tirando o presidente Fulgencio Batista do cargo.

Estados Unidos e comunismo

O comunismo veio depois, formalmente. O marco foi a famosa intriga da Baía dos Porcos, em 1962, em que no fim ele acusou o presidente soviético Nikita Khrushchev de ter se rendido às ameaças americanas. Mas, quase sem alternativas, optou por apostar no regime soviético em troca de sustentação.

A raiva dos Estados Unidos era resultado de sua admiração pelo país. Lá ele passou a lua-de-mel com sua primeira mulher (ele foi um apaixonado pelas mulheres). E lá ele se deparou com algo que o ofendia profundamente: foi contrariado.

Assim que chegou ao poder, Fidel pediu em pessoa apoio aos Estados Unidos, reunindo-se, todo sorridente, com o republicano e conservador Richard Nixon, então vice-presidente. A Nixon, em pleno período de Guerra Fria, ele garantiu, em vão, que não tinha intenções de implementar o comunismo em Cuba.

Atualização do modelo econômico é desafio para Cuba após morte de Fidel

Negado o apoio, o rancor emergiu com Fidel. E em seguida vieram os conflitos, o embargo americano, a falta de liberdade política, os baixos índices de analfabetismo, a saúde, a educação, as perseguições, as mortes, as fugas, as prisões, os dissidentes na Flórida. E o comunismo.

Cuba e Flórida sempre foram espécies de almas gêmeas. Banhadas pelo mesmo mar turquesa e pelo sol caribenho, são como números primos: especiais que nunca se aproximaram. Cuba era o destino inicial da caravana de Ponce de León, espanhol que buscava a fonte da juventude, em 1519.

Ele foi parar na Flórida, durante a Páscoa Florida – daí o nome. Depois Espanha e Inglaterra trocaram uns pelos outros. E depois os Estados Unidos, a partir de 1819, quis ambas as regiões, perdendo Cuba em 1902.

Romance de Hemingway

Nesse mesmo mar, que aproxima e distancia, o escritor Ernest Hemingway se inspirou, e escreveu entre outros o “O Velho e o Mar”, baseado nas paisagens e na vida boêmia cubanas, que por anos apreciou, até se suicidar, revelando o conflito entre vida e morte que essas paragens incitam. Como a salsa e o silêncio sepulcral entrecortado por ondas.

Diante de tantas ligações e vivências, vem a pergunta que mais se repete: a história absolverá Fidel? Os que o odeiam o acusam até de ser cúmplice ou mandante de mortes de opositores.

Os que o defendem, o admiram por ter construído uma sociedade igualitária, com educação e saúde gratuitas e de qualidade. Cuba agora, segundo Damiani, terá de aprender a viver com esse dilema. Mas, segundo ele, não é a história, mas será somente o futuro quem poderá absolvê-lo.

— O futuro tem mais tendência de absolver as pessoas do que o passado, talvez o passado seja mais implacável do que o futuro, já que as pessoas se esquecem, a história continua e ela depende do futuro. Claro que aqueles que o condenam agora, continuarão condenando. E os que o admiram, serão eternos seguidores. Mas para as próximas gerações, essa polaridade tende a diminuir.

Se isso acontecer, e Cuba se reinventar diante da finalmente encontrada fonte da juventude, novos capítulos serão escritos no cenário que Hemingway amou. O dia lindo se torna noite.

Mas não trevas. Ela também pode ser bela e acolhedora, com estrelas formando um espetáculo de luz sobre a costa cubana, numa transformação universal que faz a vida seguir em frente. Da mesma maneira, a morte de Fidel, a mudança do paradigma, o adeus do heroi e a sua memória também poderão ser, para sempre e a cada dia, revolucionários.

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