André Tal, do Jornal da Record
A primeira impressão é de desenvolvimento. Um parque eólico moderno com quase 100 turbinas em movimento. Energia limpa, tecnologia, progresso. Mas, assim como o vento forte, a riqueza da geração de energia vai pra bem longe da serra do Inácio, na divisa do Piauí com Pernambuco.
Os caminhos de terra nos levam à imagem do atraso em mais um povoado isolado e esquecido do Brasil. Aqui, a fome prevalece. A família que visitamos é numerosa. Passam das duas da tarde e ninguém comeu. O café da manhã e o almoço, simplesmente, não aconteceram nessa casa.
Dona Marizete tem 36 anos, 7 filhos e 2 netos. Quando questionada sobre o que comeu, ela é sincera. "Rapaz, hoje eu só comi... Eu não comi nada hoje, não."
A última reserva, a última esperança é o feijão guardado da colheita passada. Luiz Eduardo Silva é quem guardou o sustento da casa."Rapaz, o que tiver eu como. É rapadura, é farinha, eu como”, diz ele.
O agricultor se ressente da falta de trabalho na região. O máximo que consegue são bicos que pagam cerca de R$ 40 por semana. É muito pouco.
A esperança de todos pra que o cardápio deixe de ser o feijão guardado é o próximo Bolsa Família. Mas ainda faltam 15 dias pro benefício.
“Até lá, vamos passando do jeito que Deus conseguir”, desabafa Marizete.
As enormes pás das turbinas eólicas no horizonte no horizonte parecem ponteiros de um relógio gigante, que gira com apressado. Só que na verdade, aqui o tempo passa devagar. Devagar demais.
Quem tem fome, tem pressa.
E esse é o fim da nossa jornada pelo Brasil da fome. Quem dera o fim fosse dela. Mas ela se espalha como vento. Vento que a pandemia deixou mais forte.