AMOR E ÓDIO
UMA HISTÓRIA DAS TORCIDAS ORGANIZADAS
REPORTAGEM  Peu Araújo e Kaique Dalapola*
EDIÇÃO  Diego Junqueira
ARTE  Danilo Lataro
29/03/2017
Foto: Gabriel Uchida
A GUERRA
Nos dois primeiros capítulos da série “Amor e Ódio”, o R7 mostrou como foi a criação das principais torcidas de Corinthians, Palmeiras, São Paulo e Santos, apresentou suas relações com as organizadas de outros Estados, falou do envolvimento com o Carnaval e deu voz a líderes da TUP (Palmeiras), Pavilhão Nove (Corinthians) e ao presidente da Anatorg (Associação Nacional das Torcidas Organizadas).

No capítulo de hoje, vamos falar das manchas de sangue deixadas nas arquibancadas. Mapeamos oito das mais terríveis e violentas brigas de torcidas, além de nove assassinatos relacionados às organizadas. O que pensam torcedores e promotoria sobre uma possível ligação com facções criminosas? Conheça também “Jhony”, um ex-torcedor organizado palmeirense que tomou um tiro num confronto com corintianos.
AMOR, ÓDIO E CRIME?
Saiba o que leva os torcedores a se organizarem nas arquibancadas

As organizadas vivem de luto desde o dia 17 de outubro de 1988, a segunda-feira em que Cléo Sostenes, então presidente da Mancha Verde, foi assassinado em frente à sede da torcida. Seu sucessor na direção do grupo, Moacir Bianchi, foi executado em 2 de março de 2017, em uma emboscada na avenida Presidente Wilson, Ipiranga, zona sul de São Paulo — morreu aos 48 anos com 22 perfurações de armas de fogo.

Nos 29 anos que separam os dois assassinatos, muitas mortes se enfileiraram na memória das organizadas. Já são mais de 100 pessoas assassinadas e executadas em confrontos relacionados às torcidas. De lá para cá, no entanto, a violência se transformou dentro do grupo. As brigas de ódio, que antes aconteciam “na mão”, passaram a contar também com paus, pedras, barras de ferro e armas de fogo. E a morte de Bianchi levantou uma questão ainda mais grave: a ligação com o crime organizado. Não é a primeira vez — nem será a última — que a polícia e a imprensa farão esta associação.

Os confrontos sempre foram comuns na rotina quarta-domingo de um torcedor organizado. Não é raro ouvir torcedores mais velhos se orgulhando de vitórias em pancadarias estilo UFC e rechaçando a presença de qualquer arma que não fossem os punhos. Diferente do histórico recente, os combates eram esporádicos e espontâneos, feitos nas ruas e principalmente dentro ou nos arredores dos estádios.

“O meu pai era de torcida. Na época dele, ele viu torcida do Corinthians subir de um lado do Pacaembu e a torcida do Palmeiras do outro, só se xingando, na provocação”, comenta Jhony (nome fictício), ex-torcedor organizado baleado em 2005.

— Virou uma bola de neve [a violência], você não tem mais como voltar atrás.

Outros elementos, como pedaços de pau, pedras, barras de ferro e as armas de fogo foram sendo introduzidos nas brigas de torcidas ao longo dos anos, fazendo da violência mais evidente. Um dos episódios que escancarou a brutalidade dessas brigas foi a “Guerra do Pacaembu”, em 20 de agosto de 1995. O embate entre palmeirenses e são-paulinos na final da Supercopa São Paulo de Juniores mudou os rumos — talvez para sempre — das organizadas.

Há alguns anos, torcidas como a Mancha Alvi Verde estampam em seus bonés e roupas o repúdio à arma de fogo, que mesmo assim continuam a rondar as arquibancadas.

O contato com os torcedores organizados revela um código de regras muito particular, como o veto a roupas e acessórios verdes nas arquibancadas de Santos ou Corinthians, além de honrarias muitas vezes questionáveis. Por exemplo, por muitos anos era comum que as sedes das torcidas ostentassem itens roubados dos adversários. Um boné, um agasalho ou uma camiseta da torcida rival se tornava um troféu — prática comum, por exemplo, nos conflitos de gangues em bairros periféricos de Nova York nos anos 70 e 80.

O discurso de que o torcedor adversário é somente rival e não inimigo ainda não é um consenso dentro das organizadas. O ódio a quem está do outro lado pode ser tão grande quanto o amor às suas cores. “As torcidas ainda não entenderam que suas diferenças são apenas nas cores de camisa, mas que estão do mesmo lado do jogo, e que estão perdendo de goleada”, comenta o fotojornalista Gabriel Uchida, que há quase uma década circula entre muitas torcidas pelo País.

Conflito entre torcedores palmeirenses e a Polícia Militar no estádio do Morumbi em partida válida pelo Campeonato Brasileiro de 1996
Foto: Antonio Gaudério - Folhapress

Qual a força das facções criminosas dentro das organizadas?

A relação entre as torcidas de futebol em São Paulo e o crime organizado vem sendo ventilada há anos. A cada conflito, morte ou até nos pedidos de paz, o nome do PCC (Primeiro Comando da Capital) surge como mandante, mentor ou integrante do crime. Mas o que une esses torcedores dentro do grupo é o amor pelo clube e o ódio aos rivais, ou a prática sistemática e organizada de crimes?

Bianchi foi executado minutos depois de sair de uma reunião da Mancha Alvi Verde. Mais de dez dias após o crime, o DHPP (Departamento Estadual de Homicídios e Proteção à Pessoa) apontou Marcelo Ventola, de 38 anos, como o autor dos disparos. Os policiais o identificam como membro do PCC. Há ainda mais dois homens suspeitos de envolvimento no crime.

Apesar das investigações apontarem essa ligação, não há elementos para afirmar que o crime organizado comande as torcidas. O promotor de justiça Paulo Castilho, um forte opositor à violência das arquibancadas, faz um discurso parecido.

— O que temos são pessoas ligadas ao crime organizado que integram torcidas organizadas. Dentro de milhares de pessoas, tem pessoas que são ligadas ao crime organizado. Eu não tenho nenhuma prova e não acredito que a torcida organizada seja o foco do crime organizado. Pelo contrário, eu acho que eles não têm interesse, porque a torcida atrai a mídia negativa, atrai muito a imprensa, a população, tem muita gente contra eles.

Para André Azevedo, presidente da Anatorg (Associação Nacional de Torcidas Organizadas) e presidente de honra da Dragões da Real (torcida do São Paulo), “a generalização é um erro.”

— De forma coletiva, se é uma regra entre as torcidas, eu falo com propriedade que não é e que não tem. Eu não tenho certeza se não tem, mas não compete nem a mim nem à associação entrar na particularidade política de cada torcida. Eu acho pouco inteligente quem coloca que existe crime organizado em todas as torcidas.

O presidente da TUP (Torcida Uniformizada do Palmeiras), Marcelo Lima, comenta ainda a amplitude da facção criminosa em todo o País.

— O PCC hoje está nas periferias, está em todo lugar, “tá” no poder público, “tá” na vida de todo mundo.

As tratativas com o poder público levaram a proibições que ameaçam a sobrevivência das organizadas. Em abril de 2016, a Secretaria de Segurança Pública do Estado de São Paulo proibiu a entrada dos torcedores nos estádios com faixas, bandeiras, instrumentos e adereços que identifiquem as uniformizadas.

Para reverter esse cenário, as principais torcidas de Santos, São Paulo, Corinthians e Palmeiras se reuniram, em dezembro de 2016, com a mediação da chefe do DHPP (Departamento Estadual de Homicídios e Proteção à Pessoa), Elisabete Sato, para alcançar um acordo e pôr fim aos episódios de violência. Embora negado pelas organizadas, uma investigação foi aberta pelo Drade (Delegacia de Polícia de Repressão e Análise aos Delitos de Intolerância Esportiva) para saber se a paz não foi solicitada a mando do crime.

Enquanto a investigação continua, o poder público tomou outra medida. Determinou, em janeiro deste ano, torcida única durante os clássicos — o que é visto pelos torcedores como o primeiro passo para acabar com a festa nos estádios.



Todas as organizadas já estiveram de luto

No dia 17 de outubro de 1988, o então presidente da Mancha Verde Cléo Sóstenes Dantas Silva foi morto a tiros em frente à sede da organizada, em Perdizes, zona oeste de São Paulo. A morte do torcedor é considerada a primeira envolvendo torcidas organizadas.

29 anos após o primeiro derramamento de sangue, a reportagem do R7 separou 9 homicídios envolvendo — como autores ou vítimas — torcedores de Corinthians, Palmeiras, São Paulo e Santos.

Torcida do São Paulo matou

Corintiano
Wagner José de Lima
20/04/2000
Bela Vista, centro

Palmeirense
Alex Furlan Santana
21/02/2010
Rodovia dos Bandeirantes, Jundiaí

Santista
Márcio Barreto de Toledo
23/02/2014
Jardim Aricanduva, zona leste

Torcida do Corinthians matou

São-paulino
Leandro Araújo Lopes
06/06/1993
Zona leste

Palmeirense
Diogo Lima Borges
16/10/2005
Metrô Tatuapé, zona leste

Torcida do Palmeiras matou

São-paulino
Marcio Gasparin da Silva
20/08/1995
Pacaembu, centro

Corintiano
Wellington Martins
16/10/2005
Santo Amaro, zona sul

Torcida do Santos matou

São-paulino
Alan Rodrigues
13/05/2000
Rodovia Anchieta, Cubatão

Palmeirense
Cláudio Fernando de Morais
26/04/2015
Estação Calmon Viana, Poá

CORPO MARCADO
O depoimento de um ex-torcedor organizado baleado em confronto entre palmeirenses e corintianos

Foto: Gabriel Uchida

Cinco anos após deixar as organizadas, um palmeirense — que pediu para ser identificado apenas como “Jhony” — relata sua experiência de quase duas décadas dentro das torcidas. Sua iniciação aconteceu em 1999, o mesmo ano de sua primeira briga. Daquele ano até 2001, ele vestiu a camisa da Mancha Verde e, de 2001 a 2012, fez parte da TUP (Torcida Uniformizada do Palmeiras).

Jhony não sabe precisar o número de brigas de que participou, mas carrega no corpo muitas marcas dessa experiência. A maior delas é um tiro na barriga que tomou em 2005, na Estação Tatuapé do Metrô, em São Paulo.

Ele, que é de família de torcedores organizados, fala com exclusividade ao R7 sobre as brigas combinadas, os conflitos ocasionais, o disparo que o atingiu e também sobre a sua saída da torcida. Veja os principais trechos:



Os primeiros socos
Eu comecei a ir pra jogo em torcida em 1999. Minha primeira briga foi numa festa do chope na Gaviões e festa do Havaí na Mancha. Eu “tava” lá na Mancha, nós “tava” indo embora, do nada alguém ligou no celular e falou que a Gaviões “tava” na Sé (estação do Metrô). Aí nisso quando a gente chegou lá tomou várias canecadas, os caras jogaram várias canecas na gente e a gente só tinha o quê na mão? Fruta. Nós “tacou” fruta, extintor, o que nós conseguimos. Tinha uns moleques com rojão, foi o que deu para se defender.

Muitas vezes a gente acabava se encontrando, não chegava a marcar nada. Eu sou aqui da [Zona] Leste, do Terminal A.E Carvalho. O Terminal antes era da Gaviões, depois a Mancha tomou de tanto que ficava indo lá. Tinham ainda os Loucos da Leste, da Independente, que passavam por ali e acabava o quê? Encontrando e dava briga.

Conforme foi passando o tempo foi piorando as coisas. Os Loucos da Leste começaram a vir armados, passar de moto antes pra ver se a gente “tava”, já tentaram dar tiro. Antes as brigas aconteciam, não eram marcadas que nem as de 2007 pra cá. Você “tava” com um bonde e acabava encontrando, senão ficava caçando. Saía 7h da manhã de casa com o jogo às 16h pra encontrar alguém.



Evolução das brigas
O meu pai era de torcida. Na época dele, ele viu torcida do Corinthians subir de um lado do Pacaembu e a torcida do Palmeiras do outro, só se xingando, na provocação. Aí foi matar o Cleo (primeiro integrante de torcida assassinado pela rivalidade das organizadas) e já declarou a guerra. Aí já começou a aumentar as brigas e começou a piorar tudo. Aí matavam um de um lado, morria um do outro. Virou uma bola de neve, você não tem mais como voltar atrás.

Lá na TUP (Torcida Uniformizada do Palmeiras), a [Camisa] 12 já tentou invadir. E como foi bem perto do Carnaval, tinham várias barras, daquelas de fazer carro alegórico, então nós “tentou” defender a quadra com o máximo que deu. Um moleque chegou lá com um cabo de enxada.

Onde praticamente deu o pontapé inicial dessas brigas foi na Inajar (de Souza, avenida na zona norte de São Paulo onde frequentemente aconteciam brigas de organizadas). Teve a época do acordo, que era só na mão, mas lá que começou com bomba caseira, cabo de enxada, barra de ferro.

Briga certa
Direto os moleques da Camisa 12 me chamavam no rádio pra sair na mão, nós “juntava”. Os moleques da Torcida Jovem, os BBF (Bonde do Braço Fino) também. Quantas vezes eles falaram que iam colar no Patriarca, era tudo combinado, ligava um pro outro, chamava no Nextel. Eles falavam: “Nós ‘tá’ em 30”. A gente tentava juntar 30 e ia. Se não juntasse 30 aí era barra, bomba, rojão. Se fosse o mesmo número era na mão, mas as barras eram usadas principalmente com os BBF, que eles tinham a Kombi das barras.

Da 12 é só você ver as [motocicletas CB] 300 passando, pode ter certeza que é torcida vindo. É certeza. Você marcou alguma coisa com eles e viu as 300 passando, os caras já estão chegando.

Confusões em outros Estados
Em Belém, no Pará, é terra sem lei. Você desce do ônibus tomando tiro. A Remoçada (organizada do Remo) é embaçada.

Outra que foi ruim foi no jogo Palmeiras x Asa (de Arapiraca, Alagoas). No caminho do estádio tinha que passar por um canavial e os moleques saiam tudo de lá.

Nordeste e Norte é sem lei. Eu já vi briga de nego com enxada na mão. Os caras correm atrás com facão e enxada. Em São Paulo você não vê isso. No Uruguai é chuva de pedra. Você entra pra arquibancada já tomando pedrada.

O tiro
Pra mim, quando começaram mesmo a usar arma foi o pior. Foi em 2005, quando eu tomei um tiro. Aí começou tudo as palhaçadas. Era revide, porque foi bem na época que morreu o Munhoz (Diogo Lima Borges) da Mancha, no Tatuapé. Depois ficaram esperando o menino da Gaviões, “atacaram” ele no [rio] Tietê. Todas começaram a usar arma, mas a que mais usa mesmo é a Gaviões.

Quem atirou em mim foi o menino da Gaviões, agora é o presidente deles. Eu só senti o impacto, depois vi o Diogo caindo no chão pedindo pra tirarem ele. Ele gritava: “Meu, não me deixa morrer, me tira daqui”. Aí já era, apaguei. Acordei no hospital já.

Depois do disparo
Eu não tive apoio nenhum da torcida, falaram que eu não devia estar lá, que lá era bagulho da Mancha, não era da TUP. Falaram que eu tava lá de intrometido. Quem acabou indo lá foi o Banana, o Batata e o Gordinho da Gaviões. Pra você ver, foi cara da Gaviões que me deu [o tiro], e a diretoria deles mesmo que foi lá ver como eu “tava”. Da TUP foi só o Gordão e uns meninos que falaram que eu “tava” errado, que não devia “tá” lá, que não era o meu lugar, que devia ter saído com TUP e não com Mancha. Essas palhaçadas.

Depois eu ainda entrei em outras tretas. Era tudo igual, tudo a mesma coisa. Eu fui naquela briga das bexigadas, que os caras jogaram tinta preta e tinta óleo em nós.

Saída da organizada
Depois do tiro eu voltei. Fui na TUP até 2012. Depois que eu vi o Priscila (diretor da Torcida Independente) dentro da nossa quadra, acabou. Falei: “Nunca mais eu ponho o pé aqui”.

Ele “tava” lá por causa do Carnaval, mas onde já se viu os caras “ir” na nossa sede buscar bambu pra ir pro jogo e a diretoria emprestar. Eu nunca vi esse “baguio”, nunca.

Foi o Priscila e outro moleque, pegaram quatro bambus e quando devolveram os bambus estavam tudo pichado como o nome da Independente.

O pior não foi isso, porque por mim eu ia dar uma garrafada nele, o pior foi o Gordão (Marcelo Lima, presidente da TUP) entrar na minha frente e falar: “Ele ‘tá’ aqui pelo Carnaval. Hoje é Carnaval, se fizer alguma coisa pra ele eu ponho pra fora”.

Aí pra mim acabou. O cara preferir ficar com um cara que deu barrada em moleque nosso, que ficou 20 dias internado do que ficar do lado de um sócio. De lá pra cá eu nem uso mais roupa da TUP.

Hoje eu continuo assistindo jogo normal, tem vez que eu nem assisto, já vou dormir, porque “tô mó” preguiçoso agora. Mas assisto, comemoro normal, tenho blusa do Palmeiras, vou “trampar” com elas mesmo com o meu chefe reclamando. O Palmeiras é maior que torcida, que briga, que picuinha de diretoria. Torcida acaba, torcida passa, jogador passa, o Palmeiras sempre vai estar lá.

Torcidas hoje
As torcidas têm que parar de se matar, parar de ficar fazendo “emboscadinha” besta. O último menino da Gaviões que morreu, o Daniel (Jones Veloso, morto em setembro do ano passado). Ele era “mó” moleque firmeza. Se você “tava” passando frio, ele tirava a blusa dele e dava pra você. Ele “tava” com a mina dele voltando da casa dela, e os caras “catou” ele. Errado, “mó” palhaçada isso aí. Quer fazer alguma coisa? É no jogo, não com o cara indo pra casa. Ainda ficavam falando para a mina dele: “Corre vagabunda que nós ‘vai’ matar ele”.

Se as torcidas estão pensando em voltar e ficar fazendo “reuniãozinha” naquela porcaria daquela Anatorg, para de se matar.

Quer sair na mão? Sai na mão de verdade. Não adianta juntar 30 contra 90 e os 30 daqui estarem com arma e barra de ferro. Quer ir na mão? Vai na mão. Quer ir na barrada? Vai na barrada, mas não precisa ficar pisando na cabeça de quem “tá” no chão, não precisa abrir a cabeça um do outro.



Atualização em 29/03/2017, às 15h40 – O presidente da TUP (Torcida Uniformizada do Palmeiras), Marcelo Lima, conhecido como Gordão, disse ao R7, após a publicação deste capítulo do Especial “Amor e Ódio – Uma História das Torcidas Organizadas”, que o depoimento Jhony à reportagem “não existe”. O presidente da organizada palmeirense mandou o seguinte posicionamento:

Se eu coloquei ele para fora da quadra, algo errado ele fez. Mas não existe esse cara aqui. A cinco anos atrás, nem bambu ‘nós tinha’, e não existia escola de samba Independente. Eu nunca tive uma conversa com o Priscila, ou uma conversa cordial para pedirem bambu. Se pedissem emprestado, eu emprestaria, mas não aconteceu.

UM HISTÓRICO DA BRUTALIDADE
Relembre oito dos piores confrontos entre torcedores nos últimos 21 anos

"Guerra do Pacaembu", briga entre palmeirenses e são-paulinos em agosto de 1995
Foto: Djalma Vassao - Estadão Conteúdo

22 anos da “Guerra do Pacaembu”

Histórico de brigas das torcidas dos quatro maiores times do Estado de São Paulo

O dia 20 de agosto de 1995 é um marco da violência nos estádios brasileiros, quando as torcidas de São Paulo e Palmeiras protagonizaram uma das mais terríveis cenas do futebol nacional.

A final da Supercopa São Paulo de Juniores foi realizada no estádio do Pacaembu — que passava por uma reforma —, com um um contingente policial pequeno e uma estimativa de 7.000 torcedores nas arquibancadas.

Após o gol do atacante Rogério, na morte súbita, torcedores palmeirenses invadiram o gramado para comemorar o título. Os são-paulinos, derrotados, também entraram no gramado, dando início à batalha conhecida como “guerra do Pacaembu”.

Oito dias depois da briga, o palmeirense Marcio Gasparin morreu por causa das pauladas e pancadas que recebeu. O são-paulino Adalberto Benedito dos Santos foi o único condenado em uma briga generalizada. O torcedor foi sentenciado por homicídio duplamente qualificado, pegando uma pena de 14 anos de prisão. Ele cumpriu quatro anos em regime fechado e foi solto no início dos anos 2000.

A “guerra do Pacaembu” foi um marco na história das organizadas e de sua criminalização. Mancha Verde e Torcida Independente foram extintas e as demais organizadas passaram dois anos longe das arquibancadas. A opinião pública, que assistiu a uma batalha campal na TV num domingo de manhã, passou a apoiar não só medidas que inibiam as brigas, mas também a festa. Passados quase 22 anos daquela manhã sangrenta, sua sombra ainda afugenta as sedes das torcidas do Estado de São Paulo.



Torcida Independente X Torcida Jovem

No dia 13 de maio de 2000, Santos e São Paulo disputaram o clássico na Vila Belmiro válido pelo Campeonato Paulista. Antes do empate em 1x1, as caravanas da Torcida Independente e da Torcida Jovem se cruzaram em um trecho de serra na Via Anchieta, na altura de Cubatão. A estrada se transformou em um campo de batalha.

Um membro da Torcida Independente foi morto por um disparo de arma de fogo — o revólver nunca foi encontrado. A polícia prendeu 50 são-paulinos e dois santistas, mas todos foram liberados por falta de provas. Em 2010, o torcedor santista suspeito da morte foi absolvido.



Torcida Independente X Pavilhão 9

Durante o Carnaval de 2003, o Bloco da Torcida Independente foi eliminada pela Uesp (União das Escolas de Samba). Integrantes da maior organizada do São Paulo foram acusados de matar, a tiros, um carnavalesco da torcida corintiana Pavilhão 9 na concentração do Anhembi. Segundo a polícia, os disparos foram feitos contra seis corintianos. Ruy Luciano Nogueira, de 25 anos, foi atingido na cabeça.

Membros da torcida são-paulina são acusados ainda de irem até a sede da Mancha Alvi Verde, do Palmeiras, e armarem outra confusão, que terminou em mais duas mortes.



Torcida do Corinthians X Torcida do Palmeiras

No dia 16 de outubro de 2005, o palmeirense Diogo Lima Borges, de 23 anos, morreu com um tiro nas costas dentro da Estação Tatuapé do Metrô. O assassinato aconteceu durante um confronto entre torcedores do Palmeiras e do Corinthians antes de partida válida pelo Campeonato Brasileiro.

Depois do jogo, o corintiano Wellington Miranda, de 25 anos, foi baleado na cabeça em um cruzamento da zona sul de São Paulo. Segundo o delegado Reinaldo Corrêa, então titular da Seccional de Santo Amaro, a morte aconteceu após um conflito entre cerca de 100 palmeirenses e 60 corintianos.



Torcida do Corinthians X Torcida do Palmeiras

Uma das confusões mais marcantes entre torcidas foi uma briga entre palmeirenses e corintianos na avenida Inajar de Souza, zona norte de São Paulo, a uma distância de pelo menos 6 km do Pacaembu. Marcado com antecedência, o conflito aconteceu por volta de 10h da manhã do dia 25 de março de 2012, horas antes do clássico válido pelo Campeonato Paulista.

André Alves, o "Lezo" — membro da Mancha Alvi Verde — foi atingido com um tiro na cabeça e morreu. Segundo a polícia, entre 500 e 1.000 pessoas participaram do confronto. Sete torcedores foram presos, dois deles com a suspeita de ter efetuado os disparos.



Torcida Jovem X Gaviões da Fiel

Um morador dos arredores da Vila Belmiro, em Santos, registrou uma das brigas mais impressionantes entre torcidas organizadas. Membros da Torcida Jovem e dos Gaviões da Fiel se enfrentavam com barras de ferro e rojões antes do jogo válido pelo Campeonato Brasileiro. Cerca de cem pessoas participaram da confusão.

Um áudio entre um santista e um corintiano dá a entender que a briga foi marcada com antecedência. “Com vocês tá no contato. Antes de tretar tava no contato, depois. É briga de torcida mesmo.”



Torcida do Corinthians X Polícia Militar

O Campeonato Paulista de 2016 começou com uma onda de protestos feitos pelos Gaviões da Fiel. Entre os alvos estavam a CBF (Confederação Brasileira de Futebol), a FPF (Federação Paulista de Futebol), a Rede Globo e o deputado estadual Fernando Capez, presidente da Alesp (Assembleia Legislativa do Estado de São Paulo).

Faixas como “futebol refém da Rede Globo”, “CBF, FPF, vergonha do futebol” e “Quem vai punir o ladrão de merenda?” (em referência a Capez, um dos citados na máfia da merenda) marcaram as arquibancadas.

O primeiro enfrentamento com a PM foi na noite de 11 de fevereiro, numa partida contra o Capivariano, quando os policiais retiraram as faixas dos torcedores. Na partida seguinte, contra o São Paulo, novos protestos foram feitos e novamente houve repressão. No dia 19 do mesmo mês, uma nova investida policial marcou ainda mais o confronto e a repressão policial. Os Gaviões marcaram atos em frente à Alesp e no Vale do Anhangabaú, mas o protesto — que chegou a ser aderido por outras organizadas — perdeu forças.



Torcida do Corinthians X Torcida do Palmeiras

Nessa mesma edição, em 3 de abril de 2016, Palmeiras e Corinthians se enfrentaram pelo Campeonato Paulista. O clássico ficou marcado por três confrontos ocorridos antes de a bola rolar: em Guarulhos, no metrô Brás e em São Miguel Paulista.

Líderes das torcidas organizadas denunciaram negligências na segurança nos três pontos de conflito e relataram ainda que a prisão de Deivison Correia, de 26 anos, membro da Mancha Verde suspeito de participar de uma agressão ao presidente dos Gaviões da Fiel, elevou os ânimos dias antes da partida.

No total foram 24 prisões (18 dos Gaviões da Fiel e 6 da Mancha Alvi Verde). Uma pessoa que não tinha nada a ver com a confusão foi morta.

No último capítulo você verá que diálogo têm as organizadas com o poder público, a imprensa e a polícia.

* Estagiário do R7